(…) Pois é…
O desaparecimento da leitura em voz alta é muito estranho. O que teria Dostoievski pensado disto? E Flaubert? Já não há o direito de colocar as palavras na boca antes de as meter na cabeça? Já não há ouvidos? Já não há música? Já não há saliva? As palavras já não sabem a nada? O que é que se passa? Não declamou Flaubert a sua Bovary em altos gritos, até furar os tímpanos? Não estará ele definitivamente melhor colocado do que qualquer outro para saber que a compreensão do texto passa pelo som das palavras, de onde deriva todo o seu sentido? Não saberia ele como ninguém, ele que tanto lutou contra a música intempestiva das sílabas, contra a tirania das cadências, que o sentido se pronuncia? Então? Textos mudos para puros espíritos? Rabelais, ajuda-me! Flaubert, Dosto, Kafka, Dickens, acudam-me! Gigantescos anunciadores de sentido, venham cá! Venham soprar nos nossos livros! As palavras precisam de corpo! Os nossos livros precisam de ter vida! (…)
Daniel Pennac
Aqui podes consultar os 10 direitos do leitor, segundo este autor:
http://www.baudoprofessor.com/pdf/areasdisciplinares/Lingua%20Portuguesa/Direitos%20do%20leitor.pdf
Pois é Daniel. As tertúlias e os contos, muitos deles à lareira, deixaram de ter sentido com a inovação tecnológica.
Os sons e as imagens cercam-nos de tal modo que abandonamos a “galáxia de Gutenberg” para entrar na “galáxia de Marconi” Felizmente? Infelizmente?
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